quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O Rancor e outras virtudes

           Pautar-se pelo Bem. Esse é o princípio moral básico que abrange um grande contingente humano, e daí talvez o equivocado pensamento de que reside, nessa lei tão inespecífica, o segredo da conciliação. São belas as teorias, mas uma fração de segundo de análise nos mostra que, pela defesa de bandeiras absolutamente divergentes (e que se encontram, todas, apesar da contradição, contidas na mesma justificativa de Bem) a disputa não visa nada a não ser a imposição de conceitos geralmente orientados pela fé cega e outras imbecilidades.
            Não importam as palavras do pastor ou as dos filósofos, as grandes realizações são essencialmente movidas pelas paixões, ainda que discutidas, questionadas e reparadas, enfim, pelo intelecto. Evolução é movimento e também ruptura. Vamos aplicar minha pobre conjectura ao plano privado: Se um amigo comete uma traição imperdoável, que se faz? Não é recomendável furar-lhe os olhos com uma faca de cozinha, ainda que tal vontade seja imensa. Mais prudente é acautelar-se em relação às pessoas, como, aliás, mamãe já orientava, e fortalecer-se emocionalmente de forma a tornar-se menos vulnerável. Até aí, todas as atitudes prudentes podem ser resumidas aos preceitos de racionalização, mas conte-me, prezado leitor, de onde provém a pulsão pelas mudanças, pelas melhoras? Dos sentimentos, é claro. E, nesse caso, dos sentimentos considerados mais abjetos: o rancor e o egoísmo (afinal, quem garante que a traição seja traição aos olhos do traidor?). A discussão vai ainda mais longe: Se o indivíduo citado tivesse a sua vida inteiramente norteada pela moral, em especial a cristã, talvez escolhesse o Perdão como a melhor forma de reação. E qual o problema nisso? Nenhum problema. Tornar-se-ia um grande palhaço (apenas isso) suscetível a todo o ardil que o cerca.
            O problema não reside na ideia de Bem, mas em seu conceito, por ser, senão inaplicável, altamente incompatível com o mundo real. Da mesma forma, a ira, a inveja e a paixão romântica exacerbada não são desprezíveis em si, mas sim nos moldes em que são externalizadas. Portanto, antes de ajoelhar-se para pedir perdão por maus pensamentos, colha o ensejo para potencializá-los com o objetivo de garantir que eles lhe sirvam como estímulo e liberte-se dos seus traumas bíblicos – preconceito também é pecado.  

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Projeto Vértebra - Uma série de colunas

Não viemos para lhe contar onde lhe doem os ossos – supomos, ilustre (?) leitor, que você já o sabe. Não viemos para sustentar corpos sem espírito, para fazer a dignidade de qualquer bípede (antes pô-la em xeque). Viemos pelos pontos finais que em conjunto se tornam reticências, não de dúvida, mas de continuidade. Viemos pelas contradições que levam a conclusões. Procuraremos evitar os exageros românticos (para tais distrações aprazíveis, visitem os seguintes endereços: www.moezbert.blogspot.com / www.strongconviction.blogspot.com). Tampouco temos a finalidade de endireitar essa espinha tão torta que é a humanidade (a primeira bandeira que levantamos é a do combate ao autoengano). E não pretendemos seguir com regularidade a pernosticidade de nossa introdução (a empáfia não é exatamente causadora de empatia, embora se faça necessária num primeiro momento). A falta de esforço para obter a simpatia inicial significa apenas que sabemos bem qual não é o nosso objetivo (embora seja uma conseqüência bem-vinda): Agradar. Isso declarado, podemos começar nossa descompromissada tarefa de protesto.

Lucia M. Ghaendt-Möezbert e Francisco Mallmann